O tão esperado recesso escolar das crianças é um momento de descontração, mas que pode gerar bons frutos de aprendizado
Aproveitar bem as férias não quer dizer trocar a agenda cheia do período escolar por uma outra agenda repleta, que ocupa cada instante do dia – uma atitude que os adultos podem ser tentados a tomar para garantir que os filhos estejam entretidos e ocupados, permitindo que eles próprios possam se dedicar a seus afazeres.
Afinal, uma das funções do recesso escolar é permitir que as crianças relaxem e possam explorar o mundo a sua volta, sem tantos compromissos. É um momento de descontração, mas que pode render frutos relevantes.
- A gente aconselha que o período de férias tenha uma flexibilidade maior, não tenha tanta rigidez em relação às rotinas. As férias funcionam para a criança poder explorar mais livremente o ambiente, ter acesso àqueles brinquedos não tão formais, não tão prontos. Com isso, ela pode desenvolver a criatividade, a capacidade de simbolização e a própria socialização. Ela vai se reunir com os amigos, e aí não tem professora organizando a brincadeira. As crianças que têm de organizar, pensar as regras, preencher esse tempo, o que significa desenvolver habilidades sociais e aprender a se organizar no tempo e no espaço – observa a psicóloga Cristina Lessa Horta, doutoranda da PUCRS.
A flexibilidade típica das férias não significa deixar que a criança se esbalde diante da TV ou com videogames. Cabe aos pais oferecerem outras possibilidades. O ideal é que a própria criança participe da definição daquilo que vai ser feito com o tempo livre – escolhendo entre opções propostas pelo adulto, se for pequena, ou traçando seus próprios projetos, se já estiver mais crescida.
A oportunidade de assenhorar-se do tempo proporcionada pelas férias é fundamental para que a criança desenvolva sua autonomia e tenha uma relação saudável com as horas livres, algo que poderá ter um efeito positivo na vida adulta.
- O bacana das férias é ter uma experiência saudável com o tempo, que não reforce a relação dicotômica que depois vai nos torturar tanto na vida adulta, a tensão entre trabalho versus lazer. No caso da infância, a tensão entre estudar e estar na escola versus brincar, a ideia de que o tempo das férias é o tempo do paraíso e o tempo da escola é o da tirania – afirma a professora da UFRGS Tânia Ramos Fortuna.
- Uma aprendizagem saudável do tempo previne a nossa culpa adulta pelo tempo livre, a obsessão de preencher o tempo. Não são raras as queixas de adultos infelizes durante as férias, porque almejaram tanto aquele tempo livre de alguma coisa, mas não sabem o que colocar dentro dele, e ao mesmo tempo sentem escoar esse tempo entre os dedos, e a cada dia é menos um dia de férias, o que acaba sendo motivo de sofrimento – pondera.
A importância de aproveitar esses dias preciosos das férias não quer dizer que ficar sem fazer nada esteja proibido. Pelo contrário. Deixar que a criança tenha um tempo para si mesma é outra experiência existencial rica.
- As vezes, a gente esquece que a rotina das crianças também é difícil, que o horário é uma pressão, que elas têm muitas atividades: escola, tema, natação, aula de inglês. É muito importante que nas férias a criança possa relaxar, ter tempo de fazer o que ela quer, ter a possibilidade de escolher o que fazer e inclusive fazer nada – observa a psicóloga Luiza Maria de Oliveira Braga Silveira, professora da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre.
Fonte: Zero Hora - Matéria publicada no dia 31/12/2016