As sapatilhas pulam, batem no chão, aguardam a nova contagem para iniciar mais um passo. “5, 6, 7, 8”, vem a voz a determinar que outro movimento ganhe vida. E lá se vão as sapatilhas nos pezinhos das pequenas, a rodopiar pelo salão, ágeis, com ânsia de se movimentarem. A ponta da língua parece estar no mesmo ritmo da ponta dos pés, já que as músicas são cantadas a plenos pulmões, todas conhecidas a ponto de um observador acreditar ser repertório insubstituível. A empolgação foi tamanha na primeira aula, que Renata Salles Reis empregou mais de uma vez o tom da exclamação: “Na minha aula quero disciplina!” Afinal, não se trata de recreação e sim de dança. Há uma semana, no dia 13, a Galeria Angelina Accetta passou a sediar as aulas de jazz, aguardadas com ansiedade pelas meninas do 1º, 2º e 3º períodos.
A professora que o diga. “As crianças chegaram eufóricas, estou impressionada. Pensei que fossem ficar tímidas por não me conhecerem. Assim que as encontrei, no entanto, vi a alegria nos olhos de cada uma. E me emociono ao saber da vontade das mães em conseguir mexer no orçamento para comprar as sapatilhas. Vou levar para o resto da minha vida o orgulho que elas sentiram de estar com aquelas joias, porque para mim sapatilhas são joias”, conta Renata, com os olhos cheios de lágrimas. Ela sabe bem o que é essa empolgação em um rosto de menina, pois sua própria trajetória foi assim. Envolvida com a dança desde os 4 anos, Renata já ensinou jazz, entre outros locais, no Colégio La Salle Abel e na Academia Mary Passos. De volta após uma temporada em Belo Horizonte, não houve dúvidas quando recebeu o convite da coordenadora Karla Bustamante, sua amiga de longa data.
“Esse projeto me encantou”, evidencia, “Eu estava em busca de algo sem fins lucrativos, queria doar o que sei fazer. Por isso, quando Karla me chamou, a vontade era começar no dia seguinte”. A ansiedade foi embora quando o colaborador Fabiano ajustou o som, colocando para tocar músicas como “Paradinha” (Anitta), “Você partiu meu coração” (Anitta, Nego do Borel e Wesley Safadão), “Loka” (Simone e Simaria), “Eu sei de cor” (Marília Mendonça), “Hit do Verão” (Mc Kevinho) e “Cheguei” (Ludmilla). Uma coletânea bem dançante. Mas, apesar das meninas quererem mexer bastante o esqueleto e as músicas propiciarem isso, o segredo é a calma.
A metodologia de Renata é começar devagar, ainda mais por se tratar de crianças: “Elas estão em processo de constituição óssea, então é preciso primeiro alongar, mexer os dedinhos, os pezinhos, a cabeça, para depois elas serem apresentadas a cada passo e unirmos tudo em uma coreografia. Precisamos conhecer o que temos para só após pensar na dança em si. Quando você sente cada movimento, você começa a conhecer seus limites, entendendo por que saltar, por que fazer borboleta”. Na opinião da professora este é um legado para a vida adulta, inclusive. A consciência corporal ainda na infância leva ao cuidado com a postura, por exemplo, lá na frente, evitando a necessidade de uma reeducação.
Lição 1: sem pressa. Lição 2: disciplina. Essas dez letrinhas são como mágica para Renata Reis. Na hora de parar com a brincadeira, ela soube ter a “firmeza de pai” da pedagogia lassalista logo na estreia. “Qualquer tipo de dança em qualquer idade dá uma seriedade ao que você faz. A bailarina tem que ser disciplinada, são horas e horas dedicadas ao ensaio para as apresentações”, esclarece. Foram necessárias algumas chamadas para prender o foco das alunas, mas, no fim, a primeira aula de jazz terminou com um caloroso “abraço de mãe”.