Por Luiza Gould
Assessora de Comunicação do Unilasalle-RJ
Basta entrar na sala, no refeitório, no parquinho... Imediatamente algum deles se levanta, caminha (ou corre) até você e dá um abraço que palavra nenhuma consegue descrever. Ainda surpreso, atônito, sem saber como reagir, você olha para baixo e, de repente, não é mais necessária explicação, tudo está dito da forma mais profunda e simples. O significado do gesto era o exato objetivo buscado pela professora Ana Cláudia Maia, de Ensino Religioso. Uma vez por ano, a docente do La Salle Abel tira suas cinco turmas de 2º ano das salas de aula, e as leva, uma por vez, para entender na prática o ato de cuidar. Na segunda-feira, dia 12, foi um dos dias desse experimento na Escola La Salle RJ (antigo CEPLAS-RJ).
“Um dos nossos conteúdos do 3º período é a ética, a importância da ética do cuidado. Não adianta ter só uma formação intelectual, sem essa busca pela formação integral, de ir ao encontro do outro, ajudar o outro. Brinco que se trata de uma experiência meteórica. São só 50 minutos, mas marcantes”, explica a Ana Cláudia. Durante o tempo de sua aula, os adolescentes foram apresentados à escola pela coordenadora Karla Bustamante e puderam compartilhar momentos com os pequenos, ajudando no almoço, ou já na hora da recreação.
Fosse em um ou em outro ambiente, os estudantes mais tímidos logo estavam rodeados por crianças, erguendo mais de uma nos braços. Bom para os pequenos, mas também para os grandes, como Letícia Ribeiro, de 17 anos: “Estamos sempre acostumados com a seriedade do vestibular, a tensão. Aqui voltamos a ser criança, brincamos de pique, recebemos abraços e elas nem nos conhecem. Renova a essência”. A amiga Giovanna Colombo, de 16, faz coro. Revela que mesmo tendo um irmão pequeno em casa, viveu na Escola La Salle uma “outra realidade”. “Tudo o que elas querem é atenção”, conclui, “Qualquer gesto já transforma o dia delas, é um afeto grande, saímos muito bem”.
O carinho despretensioso, muitas vezes, guarda um apelo. Karla relatou aos alunos de 2º ano do EM haver algumas histórias de vida difíceis. Situações trágicas, como o do ainda bebê de colo presenciar o pai assassinar a mãe, se misturam a casos de falta de recursos, entre eles o de uma menina que não tem banheiro em casa. Amenizar cicatrizes vira meta da La Salle RJ.
“O cuidar é mais do que amarrar os sapatos, dar a comida na boca. O cuidado pedagógico passa por conhecer a história de cada criança, para saber o que ela passa e assim auxiliar no processo de ensino-aprendizagem. A aluna cuja família não tem saneamento básico, chegava em sala e fazia xixi na lixeira, porque estava acostumada com um balde. Fizemos todo um trabalho de apresentação do que é um banheiro, uma janela, que ela também não conhecia”, compartilha Karla.
Esse tipo de visão remonta ao surgimento do Centro Educativo e de Promoção La Salle. O nosso CEPLAS, agora com novo nome, foi criado como uma obra beneficente, com a missão de dar ensino de qualidade àqueles em situação de vulnerabilidade social e em idade pré-escolar. Legado também de São João Batista de La Salle, preocupado com a formação de professores para a educação das crianças mais pobres. No meio da brincadeira, no entanto, as trajetórias tristes se confundem com as alegres e o principal passa a ser justamente o cuidar.
“Aqui a sensibilidade aflora. Alguns jovens vêm com um olhar de caridade, mas, na verdade, percebem que quem nos ajuda são as crianças, ao nos mostrar a capacidade de exercer a solidariedade, o amor. Queremos construir uma história de cuidados, com as crianças, com o idoso, com o mundo, com a natureza, consigo mesmo”, frisa Ana Cláudia. A sementinha plantada rendeu frutos antes mesmo da volta para o Abel. Muitos alunos fizeram questão de ficar para adotar os pequenos na campanha do “Café Literário”, de doação de livros. Mais uma boa chance de estar junto deles novamente.